Relator quer investigar procuradores que pediram saída de Smanio do Mackenzie

O conselheiro Oswaldo D’Albuquerque, do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), arquivou pedido de providências em que quatro procuradores de Justiça pediam o afastamento de Gianpaolo Poggio Smanio, ex-procurador geral de Justiça de São Paulo, das funções de diretor da Faculdade de Direito do Mackenzie.

Os procuradores de Justiça Fabio Antonio Pineschi, José Manoel Mendes Castanho, Vivian Cristiane Moretto Wohlers Silveira e Angelo Patrício Stacchini sustentaram que o exercício daquela função numa instituição particular seria irregular ou ilegal, afrontando a Constituição e resolução do próprio CNMP.

O caso foi revelado por este blog em setembro. (*)

Relator do caso, D’Albuquerque acolheu argumentação de Smanio. Entendeu que teria havido “efetiva litigância de má-fé” e enviou os autos à corregedoria nacional do Ministério Público para avaliar possível ilícito disciplinar dos requerentes [com exceção de Stacchini, que é aposentado].

D’Alexandre é procurador de Justiça do MP do Acre. É mestrando em Administração Pública pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), com pós-graduações em Direito Processual Cível (Universidade Cândido Mendes) e MBA em Administração Pública (FGV).

Smanio acusara os procuradores de “alterar a verdade dos fatos”, por “perseguição pessoal”, e de colocar em dúvida a sua dignidade e a do conselheiro Otávio Luiz Rodrigues Jr.

Em contestação, o procuradores registraram surpresa com a manifestação final de Smanio, “cujos termos agressivos e personalistas não se coadunam com o caráter meramente técnico da petição inicial”, que se limita a apontar fatos e suas consequências jurídicas.

Afirmaram que Smanio “busca apenas desviar o verdadeiro foco do debate”. Ou seja, alegam que, em quase sua totalidade, as atividades exercidas por Smanio no Mackenzie têm caráter administrativo de gestão, e não atividades de magistério.

Informaram ao relator que os requerentes –todos procuradores de Justiça com mais de 30 anos de dedicação ao MPSP– “sempre mantiveram cordial relacionamento com o requerido [Smanio] e não foram movidos por nenhum motivo de ordem pessoal”, o que o ex-PGJ não teria explicitado ou provado.

Segundo os procuradores, a questão “era e é de ordem pública, interessando ao Ministério Público de todo o Brasil e à sociedade”. Insistem em que houve “equivocada e parcial leitura dos dispositivos do estatuto e do regimento da Universidade Presbiteriana Mackenzie”.

Reafirmam que “não podiam se quedar inertes ou se omitirem à vista de grave ilegalidade ‘dentro de sua própria casa’: um ex-procurador-geral de Justiça exercendo o cargo de diretor de uma grande faculdade de direito brasileira ainda integrante do Ministério Público.

Histórico do caso

Durante o plantão de dezembro de 2019, Smanio formulou consulta ao CNMP, com pedido de liminar, sobre a possibilidade de membro do MP assumir “unidade universitária”. A liminar foi deferida pelo conselheiro plantonista, “em caráter puramente acautelatório” –ou seja, até manifestação colegiada do CNMP.

Em abril deste ano, Smanio assumiu a função e, em seguida, requereu a extinção do processo e arquivamento dos autos, pretensão homologada pelo conselheiro Luciano Maia Freire, o que, segundo os autores, inviabilizou a apreciação do caso pelo plenário.

Em setembro, D’Albuquerque determinou a intimação de Smanio, para prestar informações, e a comunicação da instauração do procedimento ao sucessor, PGJ Mário Luiz Sarrubo.

Smanio informou que, apesar de o cargo ter o nome de “diretor”, as atribuições são de “coordenação acadêmica”, “sem gestão de recursos financeiros ou pessoal”, de acordo com o estatuto e o regimento da Universidade Mackenzie.

Citou que o CNJ já reconhecera a natureza acadêmica do cargo de diretor de uma Faculdade de Direito, ou seja, a possibilidade de um juiz exercer o cargo de diretoria, inclusive na própria Faculdade Mackenzie.

O relator indeferiu o pedido liminar de afastamento de Smanio, por entender que essa decisão “culminaria na satisfação integral do pleito dos requerentes” e porque não havia urgência no caso.

Considerou também que a administração superior do MPE ponderou que “nada obstante a denominação da função, o representado [Smanio] desempenha atribuições próprias da atividade acadêmica”.

Atividades de gestor

Os procuradores juntaram aos autos documento do ato de nomeação de Smanio, em que consta que o ex-PGJ foi contratado sob o regime de tempo integral, incompatível, segundo eles, com as atividades ministeriais.

Sustentaram que Smanio, já na condição de diretor da faculdade, assinara comunicado informando que uma aluna havia sido diagnosticada com o novo coronavírus.

Argumentaram, ainda, que, na condição de diretor, Smanio “promove processos seletivos para a contratação de professores, o que na essência traduz verdadeiro ‘processo licitatório’, contendo indiscutível poder de ‘nomear servidores”.

O relator sustentou que a “autorização e anuência da chefia do MPSP” quanto à atividade de Smanio confirma “a ausência de prejuízo à função ministerial”. Citou “os benefícios que as atividades acadêmicas exercidas pelos seus membros trazem de retorno ao MP paulista”.

D’Alexandre citou entendimento do ministro do STF Gilmar Mendes, para quem “o que importa é saber se a atividade de magistério está, no caso concreto, inviabilizando o ofício judicante”.

O relator entendeu que os procuradores paulistas, “em discurso aberto”, questionaram a atitude de Smanio, e, “com maior gravidade”, colocaram em xeque a lisura das decisões proferidas pelos conselheiros Otávio Rodrigues Jr. e Luciano Nunes Maia Freire.

Vislumbrou “tentativas de criar situações de suspeição e/ou desonra” em desfavor dos conselheiros, “de modo temerário a fim de produzir tumulto processual”.

Os procuradores sustentam que “nenhum dos argumentos ofertados pelo requerido [Smanio] em sua defesa afasta as conclusões do pedido de providências, no sentido de que é inconstitucional, ilegal e indevido o exercício do cargo de diretor da Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie”.

Concluem que “a permissão do exercício de cargo de diretor de faculdade por membro do Ministério Público caracteriza a abertura de um sério precedente”, com “enorme potencial de repercussões negativas no âmbito do MP e também perante a Sociedade” (…), “com prejuízo ao efetivo exercício do controle externo da atividade do Conselho Nacional do Ministério Público”.

(*) Erro de digitação corrigido às 21h52