Augusto Aras sepulta a Lava Jato

A Operação Lava Jato foi enterrada nesta semana, o que havia meses era esperado. É o desfecho de uma estratégia traçada quando o procurador-geral da República, Augusto Aras, ainda era candidato ao cargo.

Aras corroeu a imagem do Ministério Público Federal desde o momento em que esvaziou –duplamente– a lista tríplice da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República), à qual não se submeteu, e foi o escolhido pelo presidente Jair Bolsonaro.

Agora, o PGR desfere o golpe final na operação em meio às apostas sobre quem ocupará a cadeira do ministro Marco Aurélio no Supremo Tribunal Federal.

É inconvincente a explicação de Aras de que “apenas se trocou o nome de uma força-tarefa para o Gaeco [Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado], que absorve a força-tarefa”.

Em comunicado à imprensa nesta quarta-feira (3), o Ministério Público Federal no Paraná informa que “a força-tarefa paranaense deixa de existir, porém alguns de seus integrantes passam a atuar no Gaeco, com o objetivo de dar continuidade aos trabalhos”. [grifo nosso].

“Quem disse que foi posto fim à Lava Jato? Isso não é verdade”, afirmou Aras ao deixar a sessão de abertura dos trabalhos do Congresso Nacional. “Ou seja, tudo continua igual”, disse, referindo-se não só a Curitiba como também ao Rio de Janeiro, registra Daniel Carvalho, na Folha.

Nesta segunda-feira (1), o Blog revelou as duas portarias de Aras que “jogam uma pá de cal na força-tarefa da Lava Jato no Rio de Janeiro, esvaziando o modelo de combate à corrupção instalado no país há sete anos”.

Na nota à imprensa divulgada pela Procuradoria da República do Paraná, o coordenador do núcleo da Lava Jato no Gaeco naquele estado, procurador Alessandro José Fernandes de Oliveira, apresentou um balanço da “maior investigação de corrupção e lavagem de dinheiro do Brasil, que teve início em 17 de março de 2014”. [veja no final do post]

Aparentemente, o sucessor de Deltan Dallagnol tenta demonstrar que haverá benefícios com o compartilhamento de informações e a colaboração de outros órgãos:

“O legado da força-tarefa Lava Jato é inegável e louvável considerando os avanços que tivemos em discutir temas tão importantes e caros à sociedade brasileira. Porém, ainda há muito trabalho que, nos sendo permitido, oportunizará que a luta de combate a corrupção seja efetivamente revertida em prol da sociedade, seja pela punição de criminosos, pelo retorno de dinheiro público desviado ou pelo compartilhamento de informações que permitem que outros órgãos colaborem nesse descortinamento dos esquemas ilícitos que assolam nosso país há tanto tempo”. [grifos nossos]

Em portaria assinada em 7 de dezembro de 2020, a PGR integrou, ao grupo de cinco membros do Gaeco, outros quatro procuradores do Paraná ex-integrantes da força-tarefa, com mandatos até agosto de 2022.

Assim, o Gaeco passou a contar com nove membros, sendo que cinco deles se dedicarão aos casos que compunham o acervo da força-tarefa Lava Jato, estando quatro desses membros desonerados das atividades dos seus ofícios de origem:

Alessandro José Fernandes de Oliveira

Daniel Holzmann Coimbra

Henrique Gentil Oliveira

Henrique Hahn Martins de Menezes

Laura Gonçalves Tessler

Lucas Bertinato Maron

Luciana de Miguel Cardoso Bogo

Raphael Otavio Bueno Santos

Roberson Henrique Pozzobon

Outros 10 membros permanecem designados para atuação em casos específicos ou de forma eventual até 1º de outubro de 2021, sem integrar o Gaeco e sem dedicação exclusiva ao caso, trabalhando a partir das lotações de origem.

Percepção da sociedade

“Em quase sete anos, a operação descortinou a corrupção do país e mudou a percepção da sociedade sobre os crimes de colarinho branco”, informa a Procuradoria da República no Paraná.

Eis o resumo dos resultados da Lava Jato, segundo o MPF:

Até fim de janeiro, em quase sete anos de dedicação ao combate à corrupção, a operação acumula números significativos que revelaram para a sociedade os crimes de corrupção que assolam historicamente o Brasil. Foram 79 fases, 1.450 mandados de busca e apreensão, 211 conduções coercitivas, 132 mandados de prisão preventiva e 163 de temporária. Durante as fases, foram colhidos materiais e provas que embasaram 130 denúncias contra 533 acusados, gerando 278 condenações (sendo 174 nomes únicos) chegando a um total de 2.611 anos de pena. Foram também propostas 38 ações civis públicas, incluindo ações de improbidade administrativa contra 3 partidos políticos (PSB, MDB e PP) e 1 termo de ajuste de conduta firmado.

A isso somam-se 735 pedidos de cooperação internacional – sendo 352 pedidos a outros países (ativos) e 383 passivos (solicitações de outros países ao MPF). Em 2015 foram 66 ativos e 8 passivos, enquanto que em 2019 foram 67 ativos e 133 passivos. A evolução desses dados demonstra a seriedade e eficiência da operação, que passou a cooperar com investigações no mundo todo.

Mais de R$ 4,3 bilhões já foram devolvidos por meio de 209 acordos de colaboração e 17 acordos de leniência, nos quais se ajustou a devolução de quase R$ 15 bilhões. Do valor recuperado, R$ 3 bilhões foram destinados à Petrobras, R$ 416,5 milhões aos cofres da União e R$ 59 milhões foram transferidos para a 11ª Vara da Seção Judiciária de Goiás – decorrentes de ilícitos que vitimaram a estatal Valec. Também já reverteu em favor da sociedade R$ 1,1 bilhão, decorrente de acordos firmados com concessionárias por meio da operação Integração, desdobramento da Lava Jato paranaense. Desse montante, R$ 570 milhões são para subsidiar a redução dos pedágios no Paraná e R$ 515 milhões para investimentos em obras nas rodovias do Estado.