Operação Greenfield: extinção prematura e lenta desmontagem da força-tarefa (1)

O esvaziamento da Operação Greenfield, na Procuradoria da República do Distrito Federal (PR/DF), causou grande prejuízo às investigações do Ministério Público Federal na esteira da finada Lava Jato. Desestimulados, os procuradores recusaram-se a continuar na força-tarefa. Houve desinteresse de colegas em substitui-los.

Em 23 de outubro de 2020, dez membros da Greenfield enviaram ofício ao procurador-geral da República, Augusto Aras. Temiam a extinção prematura do grupo e recomendavam a prorrogação da força-tarefa.

Eles alertaram que não havia definição sobre qual estrutura e quantos membros ficariam responsáveis pelos processos após dezembro de 2020. Sem reforço, diziam, não haveria como realizar qualquer transmissão de conhecimento para uma nova equipe.

“É imprescindível não apenas a prorrogação da designação para atuar na FT Greenfield dos atuais integrantes e colaboradores eventuais da FT, até que se defina e se crie estrutura alternativa.”

Pediram que fosse “o quanto antes aumentada a força de trabalho da FT, em servidores e membros com atuação exclusiva, oriundos da PR/DF ou de outra unidade, inclusive PGR”.

Não foram atendidos. As divergências entre a força-tarefa e a cúpula do MPF atingiriam o ápice um mês depois.

Operação “no papel”

Aquela mensagem a Aras registra as origens da Greenfield e as divergências que marcariam o início da gestão do atual PGR.

A Greenfield foi deflagrada em 2016 para apurar investimentos realizados de forma fraudulenta ou temerária pelos maiores fundos públicos de pensão (principalmente Funcef, Petros e Previ). Depois,  a FT passou a cuidar também de outras operações, como ilícitos relativos a investimentos do FGTS e da Caixa Econômica Federal.

A FT ampliou as áreas de atuação, além dos objetivos iniciais. Cuidou também de investigações envolvendo políticos, como Michel Temer, Eduardo Cunha, Geddel Lima e Henrique Alves, doleiros, intermediários e outros suspeitos.

No ofício a Aras, os procuradores lembraram que, em seu início, a FT existia somente “no papel”. Nenhum dos três membros originais trabalhava com dedicação exclusiva autorizada. Eram um mero grupo designado por portaria que permitia a atuação em conjunto.

Queixavam-se de que, desde o final de 2019, a FT vinha sendo prorrogada por curtos períodos. E faziam a cronologia dos procuradores que deixaram a equipe nas semanas anteriores.

No dia 29 de junho de 2020, com a indefinição da prorrogação da FT –o prazo venceria no dia seguinte–, alertaram o PGR e o vice, Humberto Jacques, que “a prematura extinção da FT acarretaria graves prejuízos ao andamento das ações e investigações”.

No dia seguinte, foi editada portaria que determinava apenas a desoneração do procurador natural, Anselmo Henrique Cordeiro Lopes. Somente ele trabalharia com exclusividade na Greenfield.

Ou seja, desde o dia 1º de julho de 2020, todos os membros da Greenfield, com exceção do procurador natural, “passaram a acumular os trabalhos da FT com o trabalho ordinário de suas lotações [repartições] de origem, com considerável desgaste pessoal”.

Em boa parte do período de agosto de 2018 a julho de 2019 a FT contou com cinco procuradores em regime de atuação exclusiva.

Em setembro, o procurador natural, Anselmo Lopes, decidiu afastar-se da FT. Segundo reportagem de Fábio Fabrini, da Folha, Lopes manifestou, em carta a colegas, que “pesou bastante minha insatisfação com a insuficiência de dotação de uma estrutura adequada de trabalho à força-tarefa”.

Lopes calculava a necessidade de 15 investigadores exclusivos para  fazer frente, “com celeridade”, às metas de atuação da força-tarefa. “Porém nunca chegamos a superar o número de cinco procuradores exclusivos (apesar de sempre termos contado com colaboradores eventuais que nos auxiliavam em casos pontuais)”, escreveu.

Lopes afirmou na carta que a Greenfield é “um universo” de casos “que envolve cifras bilionárias”, “não sendo possível que um só procurador da República se dedique com exclusividade a esse complexo investigativo”.

“Por maior que seja o espírito público e a vontade de lutar pela Justiça, permanecer como único membro de dedicação exclusiva à força-tarefa pareceu-me inaceitável”, afirmou Lopes.

A força-tarefa havia solicitado o exercício presencial dos procuradores Leandro Musa de Almeida e Sara Moreira Leite, e, em caráter excepcional, da subprocuradora-geral Samantha Chantal Dobrowolski para integrar a Greenfield. Apesar da aprovação –em agosto de 2020–, pelo relator do projeto de reformulação das forças-tarefas no Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF), subprocurador-geral da República Nicolao Dino, essas medidas não foram tomadas. [continua]

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Este é o primeiro post sobre a desmontagem da força-tarefa Greenfield, criada em 2016 na Procuradoria da República do Distrito Federal.  Leia também:

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