STJ arquiva inquérito pedido por ex-ministro para bajular Jair Bolsonaro
O Superior Tribunal de Justiça trancou inquérito policial instaurado pela Polícia Federal contra uma médica, a pedido do então ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça. Em outubro de 2020, ela publicou em suas redes sociais a frase: “Inferno de facada mal dada! A gente não tem um dia de sossego nesse país”. (*)
Nesta quarta-feira (8), a Terceira Seção concedeu a ordem em habeas corpus para trancar o inquérito policial e determinar o respectivo arquivamento.
“Não obstante a discordância que possa surgir em relação ao comentário da paciente, isso apenas se permite no campo da moral ou do senso comum, pois do seu conteúdo não se faz possível extrair a lesão real ou potencial à honra do Presidente da República, seja porque não se fez nenhuma referência direta à essa autoridade, seja porque não expressou nenhum xingamento ou predicativo direto contra a sua pessoa, situação em que se faz presente o constrangimento ilegal”, decidiu a Turma.
Para André Mendonça, como este Blog registrou, a frase faria referência à tentativa de homicídio contra Jair Bolsonaro, durante a campanha eleitoral de 2018, e seria ofensiva à honra do presidente da República.
A iniciativa foi vista como uma tentativa do ministro de agradar o presidente, uma vez que seu nome circulava como possível indicado a uma vaga no Supremo Tribunal Federal.
Os advogados Nauê Bernardo Pinheiro de Azevedo e Isaac Pereira Simas, que defendem a médica, sustentaram em nota esperar “que o Poder Judiciário contribua para enterrar definitivamente tais determinações de abertura de inquéritos, por parte de qualquer governo que seja, em face de críticas direcionadas a seus componentes, uma vez que há uma linha muito expressa entre a crítica ponderada, abarcada pela liberdade de expressão, e o crime”.
Os defensores afirmaram que “é completamente injustificável a verdadeira devassa que a paciente sofreu em sua vida pessoal, tratamento reservado a criminosos da pior estirpe”.
Em maio último, o relator, juiz federal convocado Olindo Menezes, concedeu liminar para suspender o inquérito até o julgamento definitivo do habeas corpus.
O relator entendeu não haver evidências de que a médica tenha pretendido ofender a honra do presidente, pois a publicação trazia apenas “uma expressão inadequada, inoportuna e infeliz”, mas que, à primeira vista, não basta para servir de fundamento a uma acusação criminal.
Ao deferir o habeas corpus, Menezes registrou:
“De uma breve análise de seu conteúdo não se faz possível extrair a lesão real ou potencial à honra do Senhor Presidente da República, seja porque não se fez nenhuma referência direta à esta autoridade, seja porque não expressou nenhum xingamento ou predicativo direto contra a sua pessoa, situação em que se faz presente o constrangimento ilegal em razão da abertura da investigação em foco”.
Ainda segundo o relator, “não se divisa, pela visão que o momento o permite, ofensa à honra subjetiva (o sentimento que a pessoa tem a seu respeito, de seu decoro e da sua dignidade) do sujeito passivo”.
(*) Inquérito Policial nº 1023759-58.2021.4.01.3400 (IPL n. 2021.0023386),