O lobby mineiro para aprovar a criação do tribunal federal em Belo Horizonte
O plenário do Senado aprovou em votação simbólica, nesta quarta-feira (22), o projeto de lei que cria o Tribunal Regional Federal da 6ª Região, com sede em Belo Horizonte (MG). O texto segue para sanção do presidente Jair Bolsonaro, informam a Agência Senado e o Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Contribuiu para a aprovação do TRF-6 um forte lobby de magistrados e parlamentares mineiros. O projeto enfrentou resistências no Judiciário e na Câmara Federal, diante do receio de aumento das despesas públicas.
O projeto pretende desafogar o Tribunal Regional Federal da 1ª Região, com sede em Brasília, cuja jurisdição abrange 13 Estados e o Distrito Federal. Minas Gerais responde por mais de 30% dos processos que tramitam no TRF-1.
O projeto é uma iniciativa do STJ, pelo qual se empenhou o mineiro João Otávio de Noronha, ex-presidente da corte (2018-2020). O relator é o senador Antonio Anastasia (PSD-MG). Em maio de 2020, a Justiça Federal em Minas Gerais distribuiu comendas a 17 pessoas. Entre os homenageados, o senador Rodrigo Pacheco (DEM) –atual presidente do Senado– e o deputado federal Fábio Ramalho (MDB-MG).
Pacheco trabalhou pela aprovação do novo TRF em Minas, tendo defendido o projeto de criação em plenário. Fábio Ramalho é o relator do projeto na Câmara Federal.
O projeto seguiu para votação em Plenário após ser aprovado, no mesmo dia, pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado.
Em 2019, o Conselho da Justiça Federal, na gestão de Noronha, aprovou a criação do sexto tribunal regional federal. “Nós estamos criando o TRF-6 sem alteração no orçamento da Justiça Federal, aproveitando e redistribuindo recursos dentro do orçamento em vigor. Portanto, não terá nenhum aumento adicional ao erário, nem à União. Essa foi a nossa preocupação, pois sabemos que o momento é difícil e de contenção de gastos”, disse.
Apoio do Centrão
Em maio de 2020, o Projeto de Lei nº 5.919, que dispõe sobre a criação do TRF-6, foi colocado em discussão na Câmara Federal. O jornal Valor Econômico registrou que “o Palácio do Planalto costurou a votação do projeto com a nova base de apoio, o Centrão”.
A jornalista Maria Cristina Fernandes lembrou, na ocasião, que Noronha suspendera uma liminar do TRF-3 para que o presidente Jair Bolsonaro apresentasse seus exames da Covid-19. Bolsonaro acenou com a hipótese de Noronha ocupar a vaga do então decano do Supremo Tribunal Federal, ministro Celso de Mello. A cadeira hoje é do ministro Kassio Nunes. O novo tribunal mineiro seria um prêmio de consolação para Noronha. Em Minas, advogados apostam que seu maior projeto é ver o filho escolhido para o novo tribunal pela OAB. A assessoria do ministro já negou essa hipótese.
A proposta do TRF-6 foi aprovada na Câmara de Deputados em agosto de 2020, na véspera da troca de comando no STJ, último dia de gestão de Noronha. O então presidente da Câmara, Rodrigo Maia, afirmou: “Nós que somos contra a criação do tribunal respeitamos a posição da maioria, mas ficou claro que haverá aumento de despesa pública no próximo ano”.
Segundo Noronha disse na ocasião, o tribunal terá uma estrutura nova, compartilhando secretarias entre as unidades de 1º grau e fazendo a movimentação de servidores.
O TRF-6 contará com 18 juízes — cujos cargos deverão ser criados por transformação de outros 20 cargos vagos de juiz substituto do TRF-1 e cerca de 200 cargos em comissão. A previsão é que o TRF-6 ficará, inicialmente, com a média de porcentagem do orçamento da seção judiciária de Minas Gerais nos últimos cinco anos, que pode ser complementada até o limite do teto de gastos (Emenda Constitucional 95).
O novo tribunal deverá criar vagas para membros da advocacia, do Ministério Público e da magistratura. Esses segmentos também foram representados na distribuição de medalhas pela Justiça Federal em maio do ano passado. O projeto tem apoio do Sindicato dos Trabalhadores do Poder Federal no Estado de Minas Gerais (SITRAEMG).
Ruídos na origem
A Emenda Constitucional nº 73, de junho de 2013, prevendo a criação de quatro novos TRFs, foi questionada no Supremo Tribunal Federal pela Associação Nacional dos Procuradores Federais (Anpaf).
Em julho de 2013, em pleno recesso, o então presidente do STF, Joaquim Barbosa, concedeu liminar suspendendo a criação de novos TRFs. “É muito provável que a União esteja às voltas com carências e demandas tão ou mais relevantes do que a criação de quatro novos tribunais. A despeito de suas obrigações constitucionais e legais, a União não terá recursos indispensáveis para cumprir seu papel para com os administrados”, sustentou Barbosa, na liminar.
Em março daquele ano, a posição dos presidentes dos cinco tribunais regionais federais coincidia com a opinião de Barbosa. O então presidente do TRF-1, desembargador Mário César Ribeiro, afirmou: “Nós identificamos que há soluções mais viáveis para o Estado, sem criar todo um aparato, toda uma estrutura gigantesca, e com um gasto muito menor para os cofres públicos”.
O presidente do STJ e do Conselho da Justiça Federal (CJF), ministro Humberto Martins, disse nesta quarta-feira que a iniciativa “é um exemplo concreto de como racionalizar o funcionamento da Justiça”.
“O TRF-6 está sendo criado sem novos gastos para o contribuinte e vai desafogar o tribunal mais sobrecarregado do país, que é o TRF-1, responsável por uma demanda desumana de processos”, avaliou Martins.
O título da notícia divulgada nesta quarta-feira pelo STJ reproduz o bordão repetido por Noronha nos últimos meses sobre o projeto que alimentou:
“Senado aprova criação do Tribunal Regional Federal da 6ª Região, sem aumento de despesas” [grifo nosso].
A conferir.