Nicolau e os embargos no mensalão
O ministro Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal, defende novas regras para prescrição de crimes [quando o Estado perde o prazo para punir].
“A possibilidade de prescrever ao longo da tramitação [da ação] é uma indicação de um sistema em que não se quer punir”, afirmou Barbosa na última terca-feira.
As declarações foram dadas no mesmo dia em que foi noticiado que o ex-juiz Nicolau dos Santos Neto teve a sua primeira condenação definitiva decretada, 14 anos depois do escândalo de desvio de dinheiro público na construção do Fórum Trabalhista de São Paulo.
Em maio de 2006, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região reformou uma sentença de primeira instância, ampliando a pena de Nicolau, de oito para 26,5 anos de prisão. Essa decisão só foi tomada porque o TRF-3 rejeitou a alegação da defesa de que o prazo para prescrição havia sido esgotado um dia antes, porque 2004 foi um ano bissexto.
O caso de Nicolau é emblemático sobre a hipótese de a ação penal do mensalão receber um grande volume de recursos [embargos de declaração] com o objetivo de beneficiar os réus com a prescrição dos crimes.
Levantamento realizado por procuradores regionais da República cita como indicador da intenção protelatória dos réus do caso TRT-SP a própria nomenclatura de um dos recursos em uma das ações que encontra-se no STF:
Embargos de declaração no agravo regimental nos embargos de declaração nos embargos de declaração nos embargos de divergência nos embargos de declaração nos embargos de declaração no agravo regimental no agravo de instrumento (*).
Segundo reportagem do jornal “Valor Econômico” nesta quinta-feira (4/4), o ministro Gilmar Mendes, do STF, vê pouca relevância nos embargos de declaração no caso do mensalão:
Para Gilmar Mendes, os “embargos de declaração não têm tanta relevância porque o julgamento já se deu”. “Só no Brasil ficam imaginando que com o embargo de declaração vai ocorrer uma hecatombe”, declarou o ministro.
(*) Agravo de Instrumento nº 681668
Já ficou cansativo, na minha opinião, esse discurso gramscista sobre a ineficiência do Judiciário, repetido à exaustão.
Prezado Fred Vasconcelos, concordo com o Ministro Gilmar Mendes, em relação ao limitado alcance do recurso denominado embargos declaratórios. Entretanto, em julgamento de embargos declaratórios em agravo de instrumento, no âmbito do TJMG, na ação movida pela Liga de Desportes de Ipatinga contra a Federação Mineira de Futebol, por dois votos a um (vencida a Relatora), os Desembargadores concederam efeito infringente ao recurso e, não só mudaram a decisão anterior, que havia reconhecido a legitimidade do Ministério Público para figurar na lide na qualidade de litisconsorte, como também extinguiram o processo sem julgamento de mérito por suposta falta de interesse de agir. Ou seja, às vezes os embargos declaratórios causam hecatombes processuais.
Há um caso clássico no Superior Tribunal de Justiça, originário do Rio de Janeiro, em que a min. NANCY ANDRIGHI conheceu e proveu embargos declaratórios, dando a eles efeitos infringentes… na quarta tentativa do culto e combatente Advogado. Em todos os recursos anteriores o foco da discussão foi distorcido. Portanto, seriam EEDDemEEDDemEEDDemEEDDemREsp ou algo assim. Ou e ntão seriam EEDDemEEDDemEEDDemEEDDemAgRgemAGemREsp…
É isso que o Barbosão está esperando, que os mensalões do PSDB prescreva!
A declaração do Min. Joaquim Barbosa faz justa homenagem a ineficiência do Estado brasileiro. o Poder Judiciário é lento. Servidores, juízes, desembargadores e ministros, em geral, trabalham pouco. Para exemplificar: sesenta dias de férias mais quinze de recesso. Fora os feriados, religiosamente emendados. A juntada de petição demora mais de um mês. Despacho, mais seis meses. Publicação, mais dois. O corporativismo não deixa o problema ser enfrentado e põe-se a culpa na prescrição! Fala sério!
Comentário extremamente infeliz e generalista. Dizer que “servidores, juízes, desembargadores e ministros, em geral, trabalham pouco” é extremamente injusto. Xará, sou funcionário da Justiça Federal de São Paulo, e posso afirmar para você: eu e meus colegas trabalhamos MUITO. E afirmo isso não só em relação à Subseção Judiciária em que trabalho, no interior do Estado. Conheço a realidade da Justiça Federal de São Paulo, e posso afirmar que, ao contrário do que você diz, em todas as Subseções Judiciárias os servidores e juízes, em geral, trabalham muito e com muita eficiência. É óbvio que existem problemas. E, claro, existem servidores e juízes descompromissados (como em qualquer organização humana – seja ela pública ou particular), mas a grande maioria deles é dedicada e tem uma imensa preocupação em fazer bem o seu trabalho, apesar de todas as dificuldades que enfrentamos no nosso dia a dia. Como você, também não aprovo férias de 60 dias, emendas de feriados ou mesmo o recesso judiciário, que vai de 20/12 a 06/01. Respeitando os argumentos esgrimidos pelos magistrados, eu particularmente não me importaria se essas supostas vantagens acabassem, embora não concorde com o pleito dos advogados no sentido de que, em lugar do recesso, seja instituída uma regra de suspensão de prazos processuais, a fim de que os causídicos possam gozar suas férias. Se a jurisdição é ininterrupta ela é ininterrupta para todos. Não pode comportar exceções. Cada advogado que se adapte às regras existentes, da melhor maneira que puder. Quanto à prescrição, não adianta tapar o sol com a peneira: a maioria dos advogados que militam na área criminal (e não estou sendo generalista, pois vejo isso o tempo todo) vale-se de todos os recursos para absolver seus clientes, e um dos mais usados é o de provocar incidentes inúteis (sob o título de “garantia à ampla defesa”) a fim de alcançar a prescrição. Coisas como arrolar o limite máximo de testemunhas (8 para cada crime), cada uma residindo em um canto do país. Testemunhas que, quase nunca, sabem nada do evento, tratando-se de meras testemunhas de canonização do réu. Isso quando tais testemunhas são localizadas: não é incomum as precatórias expedidas retornarem sem cumprimento porque a testemunha arrolada pela defesa não reside no local indicado (sempre em Estados distantes do foro competente…).
Em tempo: na Vara em que trabalho, as petições são juntadas, normalmente em 24 horas; os despachos de mero expedientes são proferidos, em média, em 5 dias (petições urgentes são apreciadas no dia) e a publicação é feita em, no máximo em um mês. A maioria dos atos judiciais, todavia, são publicados mesmo em uma semana. Pense antes de falar besteira.