Supremo nega prosseguimento de ação penal sobre a morte de calouro de medicina da USP
Barbosa: “STF está impedindo que essa triste história seja esclarecida”.
Batocchio: “Laudo inocenta os estudantes. (…) São acidentes que ocorrem”.
Por maioria, o Supremo Tribunal Federal rejeitou recurso em que o Ministério Público Federal pretendia o prosseguimento da ação penal sobre a morte do calouro de medicina da USP Edison Tsung Chi Hsueh, encontrado morto numa piscina, em 1999, depois de um “trote”.
A ação havia sido trancada pelo Superior Tribunal de Justiça, em 2006.
No recurso julgado nesta quinta-feira (6/6), o MPF sustentou que havia elementos para a continuidade do processo criminal, o que poderia levar a júri popular quatro estudantes, à época dos fatos, denunciados por homicídio qualificado.
Foram vencidos os ministros Marco Aurélio (relator), Teori Zavascki e Joaquim Barbosa (Presidente).
“Não é minha primeira vez nesses meus dez anos de STF que eu presencio situação como essa. O tribunal se debruçar sobre teorias, sobre hipóteses e esquece aquilo que é essencial: a vítima. Não se fala da vítima, não se fala da família”, disse o presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, segundo relata o repórter Filipe Coutinho, da Folha.
“É um jovem que acaba de ingressar na universidade que perdeu a vida. Estamos aqui chancelando a impossibilidade de punição aos que cometeram um crime bárbaro. Quero dizer que o STF está impedindo que essa triste história seja esclarecida”, disse Barbosa.
O advogado José Roberto Batochio disse no julgamento no Supremo que o laudo inocenta os estudantes. “Lamentavelmente são acidentes que ocorrem, mas não pode a sociedade buscar a qualquer preço um infortúnio que ocorreu”.
Em seu voto [veja aqui], Marco Aurélio entendeu que o Superior Tribunal de Justiça “terminou por substituir-se, em primeiro lugar, ao Juízo e, em segundo, ao Tribunal do Júri”.
Segundo o relator, “a valoração e o cotejo analítico de provas, testemunhos e perícias médicas indicam ter o Superior adentrado seara imprópria à ação de habeas corpus”.
Para o relator, “diante da narrativa de fato típico, antijurídico e culpável, não alcançado pela prescrição punitiva, cabe apenas e tão somente permitir que a ação penal siga o curso natural, para, suplantada a fase de pronúncia, por ocasião da sentença de mérito, serem esquadrinhadas todas as provas e evidências pelo juízo natural”.
O acórdão será redigido pelo ministro Ricardo Lewandowski.
Digno de registro o voto do Min. MARCO AURÉLIO, pela reabertura do caso, com a consequente submissão dos acusados ao Tribunal do Júri.
Esse caso lembra àquele envolvendo os assassinos de um indígena em Brasília, queimaram o índio…
lamentável esses fatos.
Assisti ao julgamento. Meu coração ficou apertado em ver este absurdo, “com as máximas vênias”. Não sei se os réus são culpados ou inocentes, mas acho que a Justiça exigia que eles tivessem seu dia no Tribunal do Juri. Falando da parte técnica, o STF disse, na prática, que ninguém pode questionar decisão do STJ concessiva de habeas corpus, caso não haja uma direta ofensa ao texto constitucional. Ou seja, se o STJ ficar no texto legal, este Tribunal será imperial. Um outro lado, o ministro Joaquim Barbosa falou com siceridade e me senti representado por suas palavras.
Mais uma vez o Min. Joaquim Barbosa está com a razão, pois seu motivo explícito é a RECUSA em legitimar um resultado, uma consequência de ato judicial, quando os efeitos se mostram iníquos, e causam revolta na população, porque supostamente estariam de acordo com aquilo que os pedantes chamam de “tecnicalidades jurídicas”. O que soa obsceno, quando se trata de examinar um caso de morte.
Os tribunais podem trancar a ação penal, na aplicação da doutrina brasileira do habeas corpus, para evitar que alguém – acusado sem nenhuma base em fatos ou sem o devido enquadramento jurídico – passe pela via crucis de um processo que, em si mesmo, seja um castigo.
Todavia, as situações de falta de nexo entre a causa suficiente e o resultado delituoso, ou entre a imputação de autoria e a possibilidade concreta do acusado ter agido, e outras semelhantes ABSOLUTAMENTE não estão presente no caso de um trote violento, em que se expõem calouros a exposição de risco, quer por serem agredidos, quer por estarem obrigados a ingerir bebidas alcoólicas na beira de uma piscina.
O triste de tudo isso é que, mais uma vez, forma-se uma maioria que demonstra TENDÊNCIA INTENCIONAL de criar um Judiciário submetido aos azares da sorte, da política, do trafico de influência ou da pressão de poderosos. E, preparemo-nos e não esqueçamos, tal com em um passado que pensávamos ter superado, Lewandowski vem aí…
É cada vez mais decepcionante a postura dos órgãos ditos “da Justiça” do Brasil. Só comprova que aqui, dependendo da família a que pertence, aos contatos – sociais e principalmente políticos – e à influência dos mesmos, é permitido tudo, incluindo o direito de cometer as maiores atrocidades, físicas e morais, contra outras pessoas menos privilegiadas, sem que haja nenhum tipo de repressão ou no mínimo, uma tentativa de esclarecimento dos fatos com interesse de justiça. Não se trata de clamor popular ou comoção infundada; se trata de uma vida que se foi. A impunidade, para alguns, é garantida pela burocracia, pelas brechas nas leis mas sobretudo, pela falta de vontade e de bom senso que assolam os corredores dos órgãos judiciais brasileiros. Antes diziam que “a corda sempre estoura do lado mais fraco”. Hoje, com tanta distorção, demagogia e interesses acima da verdadeira função pública, o lado mais fraco parece que nunca é o da vítima, mas sim daqueles que possuem bons, notórios e caros advogados. E, se ironicamente, ainda por cima ter um que virou ministro da justiça, melhor ainda. Não há nada que um bom jeitinho não resolva; pena que, para quem perdeu um filho vítima de uma brincadeira estúpida e assassina, infelizmente não haja mais nenhum jeito, nem o de esperar que a justiça seja feita pela maior instância jurídica do país. Vergonha.
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Comentário preciso, impecável e desapaixonado. Uma análise realista de nosso triste cenário político e social. Peço sua autorização para assinar embaixo também.